Reencontro


A professora Manuela é daquelas professoras que ficou na minha vida. Decididamente.
Apesar de ter mantido contacto com alguns dos professores do ciclo (que foram como segundos pais), com a prof. Manuela é diferente.

Lembro-me de ficar a olhar para ela durante as aulas e pensar:
- Quando for grande gostava de ser como ela!

Apesar da disciplina de Historia nunca ter sido das minhas preferidas, especialmente a parte dos egipcios e afins... sempre fiz um esforço por estudar mais, porque para decorar (que foi desde sempre um dos meus maiores handicaps) nunca tive mesmo grande jeito.

Com ela comecei a compreender a historia da cidades. A razão porque as casas começaram por ser redondas e sem paredes... Como é que uma simples muralha alterava o estatuto e os direitos de uma pessoa na sociedade. Com ela comecei a dar importancia à Cultura. Ao que é nosso. Ao patrimonio. A compreender a sociedade.

Há 2 ou 3 dias, reencontrei-a. Desta vez no supermercado. Chamou-me.
- Joana! Tenho me lembrado tanto de ti !- disse ela enquanto me cumprimentava.
- E tenho me lembrado de si, professora. Muito.
- Ando para te ligar... temos de combinar tomar um café e conversar.

Cada vez que nos encontramos, na rua, sem nenhuma combinaçao, ficamos horas à conversa, como se parecessem só 10 minutos.

Trocamos sempre mensagens no Natal, e até postais. Há uns 5 anos, no Natal recebi um postal seu, sem estar à espera. Tinha encontrado algumas fichas, entre as quais a minha e resolveu mandar-me um postal. Lembro-me da emoção de o ter recebido. A partir daí retomamos um contacto mais regular.

Lembro-me de ter chorado, como poucas vezes chorei, na primeira vez que a re-encontrei na escola, num intervalo, no ano em que decidiu não continuar a dar Historia à nossa turma. Abracei-a a chorar. Tinha 14 anos. Acho que foi das minhas primeiras perdas. Nesse ano, no 1º Periodo (do 9ºAno) tive a minha 1ª e unica negativa da vida (sem contar com a faculdade, claro). Lembro-me de ter vindo conversar comigo e pedir-me para fazer um esforço para melhorar a nota. Que eu era muito melhor.
Soube mais tarde que apesar de deixar de ser nossa professora, continuou a acompanhar-nos de muito perto. Ia sabendo como nos corria a vida. Lá acabei por recuperar para um 4, mas a verdade é que nesse ano fizemos a vida negra à nova professora. A mim ficou-me sempre essa atravessada.

A professora Manuela era moderna. Simples e discreta. Sem peneiras. Inteligente. Continua assim. Sempre que ia fazer uma viagem trazia qualquer coisa para nos mostrar. E contava imensas histórias. Lembro-me de numa dessas viagens, ter ido à India e trazer as maos todas pintadas, com uns rabiscos quaisquer, que nos explicou, tim tim por tim tim.
Um dia descobriu que a minha mãe, que entretanto era sua colega na mesma escola, era minha mãe. Ficou toda contente. Nessa altura eu já andava no liceu, mas mandava-me sempre beijinhos e perguntava por novidades minhas.
Uma dessas vezes que nos encontrámos conversámos sobre a relação com os pais. Contou-me que também chocava com a mãe, mas que tinha resolvido tudo e ficado tudo bem, antes de morrer. Falou-me da falta que sentia deles. Aconselhou-me a que dissesse sempre tudo e que fizesse sempre por resolver os problemas, não deixasse coisas por dizer. Essa conversa deu-me muito que pensar...

Tenho orgulho dela por se lembrar de mim. Por mantermos o contacto. Por me dar conselhos. Por falarmos de teatro. Da vida. De gostar como eu dos Jardins de Serralves. Do Castelo. De me ter ensinado a crescer. De me ouvir. Por saber que não se esquece de mim.
Quando nos encontramos conta sempre histórias que eu ja nao me lembro, mas que ela nao se esquece. Sobre as perguntas (parvas) que lhe faziamos. Da vida negra que faziamos a alguns professores.

Não entendo porque é que só falamos e prestamos homenagens às pessoas quando elas morrem. Quero contrariar essa mania idiota. A professora Manuela faz parte da minha vida e por isso estou a falar dela hoje.

E ainda hoje, dei por mim a pensar:
- Quando for grande gostava de ser como ela!
E gostava que alguém se lembrasse assim de mim, como eu me lembro dela...


2 Respostas ao “Reencontro”

  1. Blogger mi 

    estou emocionada com o que li...

    vês como és especial e importante?!

    acho que já és grande,
    acho que já és como a professora Manuela,
    acho que há muita gente que se vai lembrar sempre de ti!

    beijinhos!!!

     
  2. Blogger AR 

    Essas são as pessoas que importam nas nossas vidas: as que chegam e nos transformam, por dentro, fazendo-nos melhores e mais completas. Tenho pessoas assim na minha vida... e lembrei-me agora que, às vezes, nem me lembro disso.

     
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